Rafael Alonso: Olho Grande:
Bem-vindo a Olho Grande. O sol caiu. Tombou do alto. Tudo no balneário de Olho Grande é um amontoado de memórias e projetos despejados por suas ruas quadriculadas. Grandes sambaquis espalhados pelas esquinas, pelas portas das casas, pelo mar, no alto das copas das árvores ocas, prateadas e que lembram escadas. O sol cansado não se retira mais. Um poente que nunca se põe.
Um pintor de paisagens idílicas sozinho reproduz incansavelmente a mesma cena que outrora diziam ser corriqueira em Olho grande - a das Grandes Araras que sobrevoavam as casas empilhadas e faziam seus ninhos no alto dos morros e gritavam ao pôr do sol incessante.
A praia de Olho grande é pequena, um quadrado aconchegante no meio de tudo, uma praia sem sombra, de luz fria e constante. De lá o pintor consegue ver ao longe o oceano ou imaginá-lo derretido com uma fina camada oleosa na superfície.
Uma banda de pagode se posiciona todas as tardes intermináveis à frente do único bar onde esse mesmo pintor produziu lindos afrescos com paisagens incontinentemente nostálgicas. Nessas tardes o marinheiro mareado acena para o mar desejoso por surtos repentinos de lembranças que irremediavelmente se tornam ruínas.
Rafael Alonso