Laura Belém: um pássaro corta o espaço

Apresentação
O título da exposição de Laura Belém poderia estar em uma lista dos menores contos do mundo. São apenas cinco palavras, 34 caracteres com espaço. Se desconsiderarmos os espaços, são apenas 29 batidas dos dedos no teclado do computador. Ao mesmo tempo, nesse pequeno intervalo somos surpreendidos pelo pequeno corte de uma cena ou o frame de um filme em um título no qual todas as letras são minúsculas, como um trecho no meio de uma frase. Impossível não pensar como se chegou até ali, ou o que vai acontecer depois. Talvez porque o grande personagem dessa imagem construída pela artista não é nem o pássaro (como seria mais fácil imaginar) nem o  espaço (uma segunda opção plausível), mas sim o movimento, capturado enquanto ele acontece em frações de segundos. O ato de cortar configurado no tempo presente. 
 
um pássaro corta o espaço como título é o marco de início dessa exposição, mas é também seu meio e seu fim. O interesse pelo movimento, em diferentes aspectos e em múltiplas leituras, é uma das questões importantes para a produção de mais de duas décadas de Laura Belém. Em seus trabalhos vemos uma constante investigação desse substantivo que é também verbo, uma vez que todo movimento implica a ideia de ação. É algo que se dá no tempo, por certo tempo, e no espaço, invariavelmente. E como verbo, pode ser conjugado no presente, no passado e no futuro. Nesse sentido, as obras da artista são como pêndulos que oscilam entre rastros e restos, memória e fabulação, deslocamento e transitoriedade, herança e projeto, tentativa e erro. Um pensamento que toma corpo (literalmente porque toda ação é praticada por alguém) de maneira recorrente em uma produção que privilegia as séries, os agrupamentos, com trabalhos que valem por si só, mas que também ganham outras camadas quando em conjunto, na construção de espaço e significado entre eles. E aqui vale dizer que “eles” são aqueles que a artista nos dá a ver no espaço expositivo, e também todos os outros que ficaram pelo caminho. A obra é o que fica, mas também é o que sobra. 
 
Há, por tudo isso, a presença de um pensamento performático na produção de Laura Belém, que nesta exposição se estrutura no olhar para a natureza e o meio-ambiente. Não como temas ou assuntos, mas por suas lógicas de funcionamento, tempos, processos e como resultado da relação com o Homem. Desde à referência aos pássaros, como o do título, que são agentes importantes para o funcionamento e o equilíbrio do ecossistema, regenerando florestas e ambientes degradados. Há também folhas, espinhos, vida marinha, rejeito de minério e vestígios de recortes de jornais sobre meio ambiente, mineração e agronegócio. Todos presentes também enquanto materiais deslocados para a produção artística. Rastros ou refugos de uma paisagem em movimento. Instantes de uma constante transformação. Resultado da relação entre corpos. Tudo o que vemos está ali por um tempo ou levou um tempo até chegar ali. É o que fica, mas também o que sobra e o que se transforma.
 
Fernanda Lopes
Vistas da exposição
Obras