Jonas Arrabal: Ensaio sobre uma duna
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Apresentação
Em Ensaio sobre uma duna, instalação inédita que ocupa o centro da Sala Casa e que dá nome à primeira exposição individual de Jonas Arrabal na Athena, vemos quase que um panorâma da produção do artista, reunindo materiais aparentemente muito diversos, que o interessam desde 2011. É como um curioso diálogo com as caixas-valises de Marcel Duchamp ou com a ideia de museu imaginário de André Malraux. Organizados em prateleiras e reverberando pelas paredes, estão elementos da natureza e materiais orgânicos, como tinta de lula, galho, concha, craca, ostra, marisco e outros refugos, além de uma espécie de coleção de amostras de sal extraídas da água de locais como a praia no Rio de Janeiro, a Baía Concepcion no México, e a praia em Riomaggiore no mar da Ligúria (na Itália). Estão também materiais industriais, como vidro, aço, espelho, betume, chumbo e bronze.
Nas minhas anotações para este texto, estava escrito que esses matérias orgânicos e industriais estão em oposição, mas enquanto escrevo tendo a pensar que eles na verdade são muito próximos. "Tudo o que fiz de importante pode ser colocado numa pequena valise", afirma um dos aforismos dadaístas deixados por Marcel Duchamp. Em seu Ensaio, Jonas Arrabal coloca lado a lado materiais que são importantes para contar a nossa história. Materiais que se encontram no presente para falar de passado e futuro, que são ao mesmo tempo lembrança e projeto. Eles nos ajudam a contar a história do "progresso" humano, mas também são parte da história do próprio artista.
Jonas Arrabal nasceu em Cabo Frio, maior cidade da Região dos Lagos do Rio de Janeiro e destino da sua família de origem oriental no inicio do século 20 . Fundada nos primeiros anos do século 16 pelos portugueses, a cidade teve durante muito tempo na extração do sal a sua principal atividade econômica, sendo a década de 1930 o auge dessa produção, com 120 pontos de extração que produziam cerca de 80 mil toneladas de sal por ano – praticamente 70% de todo o sal que era consumido no país naquele momento. Nas últimas quatro décadas, esse volume diminuiu drasticamente, registrando nos últimos anos, com dificuldade, a produção de 15 mil toneladas.
O brilho das salinas na paisagem e a relação com o mar, mas também essa experiência de abundância, declínio e ruína marcam o olhar do artista. Permeando essas questões há um aspecto fundamental: o tempo. Ou melhor, a passagem do tempo. Seja no âmbito afetivo ou histórico/funcional, tempo é o espaço entre dois pontos. É duração. Para o artista, o tempo é uma ferramenta escultórica que age sobre os corpos, sobre a paisagem. E aqui estamos falando desse tempo que é ação, que é verbo, mas também o tempo enquanto clima, intempéries e agente da paisagem. Boa parte do pensamento de Jonas Arrabal está ancorado da observação do tempo e em como torná-lo visível.
A imagem de uma duna, presente no título desta exposição, é uma representação visual do tempo e também do processo de trabalho do artista. Como ampulhetas naturais, as dunas são ecossistemas construídos pela ação dos ventos, que desgastam rochas ou reúnem em grande quantidade pequenos grãos de areia muito fina. Ao encontrarem no caminho obstáculos, como partes de vegetação, vão formando montes, que aos poucos se transformam em montanhas de diversas formas e tamanhos. Em constante transformação, as dunas podem alterar sua forma, se deslocarem, diminuírem ou aumentarem, a depender da força e da direção dos ventos, e da resistência que vão encontrando pelo caminho.
Assim como as dunas (e as marés), a produção de Jonas Arrabal reúne elementos que se encontram e se reorganizam constantemente, mostrando inclusive suas estruturas e seus versos, como ensaios interessados na experiência. Em pouco mais de dez anos de trabalho, o artista vem construindo um corpo de obra interessado em uma reflexão sobre a transformação constante das coisas, dos lugares. Tudo aqui existe, existiu e segue existindo. Tem passado, resiste no presente, e se rearticula na tentativa de garantir a possibilidade de um futuro. Em seu Ensaio sobre uma duna, Jonas Arrabal nos mostra que insistir no desejo de permanecer vivo é inevitável.
Fernanda Lopes
Vistas da exposição
Obras